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Foto do escritorCristiane d'Avila

Terça-feira, 10/05/1921

Coluna Bilhete


Transcrição


Dr. Alfredo Pinto. Justiça – Ministro, se V. Exa. recebesse a carta seguinte, a quem a atribuiria? Leia:

“Podemos dizer o doloroso ‘está feito’? Escrevo-lhe estas linhas, depois de ver no Municipal o Dr. Epitácio aplaudir o Rozemberg com aquele ar graúna que o provinciano autoritário e pernóstico jamais perdeu. O Municipal com o Sr. Calógeras na plateia e o Sr. Epitácio fazendo o imperador contente, deu-me a sensação exata dos acontecimentos: o presidente vencerá a sua ‘grande’ batalha movimentando uma câmara contra dois homens eleitos, que são, ao de mais, duas altas expressões de talento, de coragem cívica e de patriotismo!

“Creio bem que nunca se deu na República indecência maior e prova de despudor tão espalhado e tão alvar!

“Chegamos a um tal estado de desfibramento, o sangue carioca está tão geleia de marmelo, que hoje, entre os cavadores e os negocistas qualquer sujeito com um pouco de decisão pode mandar de relho em punho, pode transformar a Câmara em picadeiro de circo da roça, pode se fazer já não digo apenas César mas até, se quiser, Imperador do Divino!

“Os jornais andam a atualizar antigos discursos de retórica balofa do Sr. Epitácio. Para quê? Para mostrar o Sr. Epitácio em contraposição ao antigo Epitácio?

“Mas o homem não mudou. Mudou a posição apenas. Ele protestava porque era o outro a dominar. Dominando ele – nem justiça, nem Constituição, nem verdade. Uma câmara de cócoras, quando muito.

“O Brasil inteiro deve esperar a depuração de Maurício de Lacerda e Nicanor do Nascimento, a depuração que uma tropilha assustada prepara, uma tropilha que tem o Arthur Lemos dando pareceres. Deve esperar a depuração ordenada pelo Sr. Epitácio Pessoa como uma prova dos homens que desde 1859 pretendem governar a nação.

“Não há pontapé mais cheio de desprezo do que esse com que o Sr. Epitácio, depois de desastrosa administração, depois de ter arrastado o país à ruína e as populações à fome, referenda o seu nojo de feitor pelos espinhas-tortas que se agacham na Câmara. E o espantoso é de como essa gente (amanhã fatalmente contra ele, amanhã ??? desde que haja outro presidente) sabe estar cometendo um crime e com toda a sabujice vota contra o reconhecimento de dois homens eleitos!

“Esses ‘degolamentos’ de um Herodes com executores e salomés de mais, não cansarão afinal os brasileiros? Não se erguerá do atentado inacreditável o grito do Brasil novo? Iremos, escravos inconscientes, amarrados ao carro triunfal de um César delirante? Não! Eu ainda espero que a Câmara tenha vergonha e se negue a obedecer ao furibundo homem.”


A quem atribuiria V. Exa. a digna cólera dessa missiva, Dr. Alfredo Pinto?

Estou vendo V. Exa. fincar mais os óculos e dizer com um riso para dentro:

– Seria do próprio Epitácio, se fosse apenas deputado eleito!

E V. Exa. diria a verdade. Epitácio escreveria isso se não fosse presidente – o presidente autor da ignominiosa tragédia da Câmara.


João do Rio

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