top of page
  • Foto do escritorCristiane d'Avila

Terça-feira, 18/01/1921

Atualizado: 16 de jun. de 2021

Coluna Bilhete


Transcrição


Carlos Sampaio – Na Prefeitura – Meu caro Prefeito. Na onda de jacobinismo em rebentação por aí, sempre me pareceu impossível vê-lo. Você é muito civilizado e usa há tanto tempo fatos talhados em Londres que eu não o imaginaria jamais tendo tempo para ouvir um desses energúmenos que vão ao Catete comunicar a novidade “o Brasil é dos brasileiros”. O Brasil é dos brasileiros enquanto esses brasileiros não o prejudicam, não o sacrificam e não o tornam causa de espanto aos olhos dos estranhos.


Há tempos apareceu entretanto uma circular determinando que nas escolas se fizesse um inquérito: quais os empregados estrangeiros. Já o Washington Luís na nova remodelação do ensino exige em São Paulo que só possa ensinar história do Brasil e português o brasileiro nato. Era pois perfeitamente razoável que nas escolas do Rio se pensasse a sério em investigar a certidão dos contínuos e dos empregados da limpeza – porque, ao que me parece, não há no magistério municipal senão duas estrangeiras: duas japonesas naturalizadas.


De certo o inquérito foi feito, porque outra circular apareceu indicando a quem de direito informar quais os empregados que não são brasileiros natos. Vê-se bem, meu caro Prefeito, que quando os inspetores foram ver quais os estrangeiros, como mandava a primeira circular, os ditos estrangeiros tinham compreendido o ideal do Sr. Villar na defesa das costas e o tino japonês, isto é já se haviam legalmente naturalizado como as Sras. Teru Kumakê e Toki Kumakê. À resposta de que só havia brasileiros, o Catete e as influências eleitorais notaram a necessidade de nacionalizar bem, de só deixar varrer a escola um senhor nascido no Brasil, eleitor e cabo de eleitores.


Enquanto esperamos o dia de coisa ainda mais radical, não acho mal nem quero discutir que Carlos Sampaio mande despedir de modestos empregos homens que até então se têm portado bem, apenas porque eles tiveram a sorte de não nascer, como o Dr. Epitácio, no Norte. Noto que o sacrifício de meia dúzia de empregados é simplesmente ilegal.


A Constituição estabelece de modo tão claro os direitos dos estrangeiros naturalizados, que eles só não podem ser presidente da República. Tanto que o coronel Brandão teria todo o direito a ser prefeito – se deixassem o esforçado edil ocupar um cargo que pitorescamente o Sá Freire também já ocupou.


Há, ilustre Prefeito, em tudo, agora, uma espécie de maluqueira galopante. A maluqueira insiste quase sempre no pormenor, esgota energias em pequenas coisas. Vemos homens graves fazendo coisas que parecem pilhérias. Haja para amostra o Sr. Ferreira Chaves queixando-se ao Simões Lopes dos vendedores de peixe do Mercado, que para ele, Ferreira Chaves, são o empecilho das feiras livres – como se fosse possível que por exemplo Ferreira Chaves pescador deixasse de ganhar mais ali adiante, vendendo o seu peixe pescado honestamente, porque mais aqui lhe inibiam disso alguns homens sem a pressão da autoridade do Dulphe...


Ora, é dessa doença ridícula que eu o julgo livre. O homem que vai arrasar o morro do Castelo é um homem que vê as coisas em grande. E a circular é não só inconstitucional – é ridícula. E você não pode deixar de pensar como o

Seu ex corde[COB1]


João do Rio


[COB1]http://www.dicionariodelatim.com.br/ex-corde/

De coração. Expressão empregada no fecho de cartas dirigidas a pessoas íntimas.

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page