Coluna Bilhete

Transcrição
Ao Amável Leitor – Deixe-me você chamá-lo assim, como faziam os romancistas de 1830 nos prefácios das suas obras fatigantes. Deixe-me tratá-lo assim, se realmente você lê este bilhete com simpatia. Deixe-me também tratá-lo com o mesmo qualificativo, se você anda zangado comigo. Porque eu preciso da boa vontade de todos os leitores para insistir num assunto em que sempre tive razão.
Esse assunto é, amável leitor, o patriotismo jacobino.
Há seis meses, bato-me contra essa gente, que usa dos insultos das baiúcas [COB1] e pretende que os outros morram de caretas dos poucos inteligentes. Há seis meses demonstrava que nunca foi patriotismo expulsar poveiros, impedir a imigração, insultar os portugueses. Há seis meses os invejosos atribuíram a propriedade deste jornal a várias colônias e puseram-me em leilão, vendido, tornado a vender aos “inimigos” do meu país. Há seis meses o público cada vez compra mais A Pátria, compreendendo (ele, o povo) a lealdade, o entusiasmo, a franqueza de um jornal que é do leitor, que é um “agora” – a praça da opinião pública. E, insistentemente, há seis meses, eu aponto a pilhéria prejudicial do jacobinismo duvidando desse nacionalismo...
Pois agora veio o caso dos nossos navios.
Por mais que o governo nacionalista do Sr. Epitácio queira explicar estar tudo resolvido, os navios não vêm, e só se prova a incompetência e a fraqueza do dito governo. Estamos mesmo diante da última pilhéria da França perfeitamente atônitos. Essa pilhéria foi dizer ao Sr. Rodrigo Octavio: “Pode ir, você é nosso irmão!”
E, mal o Dr. Rodrigo Octavio chegava ao Rio – submeter de novo o caso à discussão, “à consideração da Inglaterra e da Itália”.
Patriotismo é fé na sua pátria, é querer a sua pátria igual às maiores, sem se curvar a nenhuma, sem admitir que ninguém a menoscabe[COB2] . E quando o povo se levanta, quando todos nós, brasileiros, com o orgulho de sermos brasileiros, gritamos que é de mais, que não pode continuar a chuchadeira com que a França nos empalma trinta navios, quando os brasileiros de verdade sentem-se indignados – os nacionalistas, os cavalheiros que gritam “nacionalismo ou morte!” e faziam meetings semanais para insultar os portugueses – esses cidadãos metem a viola no saco, não aparecem, somem-se!
Nem Conde Celso, nem o impertérrito [COB3] Delamare, nem sombra de nacionalistas!
Ora, eu desejava perguntar, amável leitor, ao seu bom senso, que pensa dessa gente, cujo frenesi patriótico é violento contra Pedr’Alvares, mas desaparece em se tratando dos franceses que nos batem os nossos navios – quando soube que o desembargador Geminiano, bombista lúgubre que mandava a polícia garantir as tolices do Delamare contra os portugueses – deu ordens terminantes aos seus delegados para proibir o comício de protesto do povo carioca contra o modo por que a França pretende se apossar do que é nosso! Há nada mais triste e mais vergonhoso? Isso é medo ou estupidez?
Que dirá o estrangeiro vendo um governo que consente em ofensas a Portugal sem que Portugal tenha deixado de ser nosso amigo, proíbe a expressão colérica do povo contra uma nação que nos abocanha 30 navios? Daí, depois disso, pedir-lhe apenas, amável leitor, que concorde numa coisa: quem via claro, quem tinha razão era este seu criado, obrigado.
João do Rio
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