Coluna Bilhete
Transcrição
S. Exa., onorevole [COB1] Pessoa de Queiroz, Nesta – Meu caro Francisco. Bom dia. Não sabendo para onde dirigir estas linhas, ponho simplesmente a indicação: nesta. Os correios têm interesse em mostrar conhecer as notabilidades. Nunca se deu o caso de uma carta dirigida a Lloyd George, a Epitácio, a Clemenceau, a Celso Bayma, não chegar ao destinatário – menos quando, estando esses figurões no ostracismo, o governo por prudência as sequestra. Você está no caso.
Este bilhete ser-lhe-á entregue, ou na Câmara (onde os deputados hesitam tanto em homenagens dignas da sua sorte que de certo acabam fazendo-o superpresidente), ou no Catete, ou na sua residência denominada Casa Branca pelos oficiais da secretaria presidencial, não sei se para compará-la à White House de Washington, se em memória da modinha de Guimaraes Passos: “A Casa Branca da Serra”.
Assim, lendo este bilhete da pessoa (pessoa, infelizmente não pertencente à inumerável família Pessoa) da pessoa, digo, que mais bem lhe quer, depois de seu tio e dos seus irmãos, você receberá os cumprimentos muito afetuosos que lhe endereço pelo medo do inimigo da imigração José Bezerra, elegendo-o deputado.
Depois você permitirá uma reflexão e um pedido.
A reflexão é a seguinte: não será você com a sua boa fé imprudente lançando a candidatura do José Bezerra a substituto do seu tio? José Bezerra é um camaradão enquanto precisa. Depois, mete os pés – que aliás são grandes, as únicas grandezas desse estadista, além da manha esperta. Você imprudentemente lançou Bezerra. Mas se conversar com o Rosa e Silva, com o Dantas Barreto, com aquele senador a que José substituiu no governo de Pernambuco – eles terão de lhe dizer que Bezerra é um amigo perigosíssimo.
Você vive num tal estado de glória que sentiria muito sendo forçado a descer da apoteose permanente. É preciso defender-se. O verdadeiro presidente, o que lhe conviria in totum para o futuro quadriênio, seria o Dr. Epitácio, seu tio. Mas, apesar dos governadores estaduais começarem a prezar a reeleição, parece-me que o governador-geral da Federação ainda não pensou nesse golpe final contra a Constituição. Daí a necessidade de um outro camarada leal, sob o qual o meu querido Francisco não tenha de amargurar um resto de legislatura como qualquer simples deputado.
Passo em memória os nomes dos seus amigos atuais e os dos estadistas papáveis. É uma desolação. Não encontro nenhum que me inspire confiança, a não ser o Conde Affonso Celso, muito sensível ao elogio, que faria o Delamare substituir na pasta da Guerra o general dos boy scouts [COB2] João Calógeras.
Mas a este oponho-me eu. Os jacobinos já anunciaram que na impossibilidade de mostrar patriotismo no caso da França com os nossos navios, estão dispostos, com a permissão do macrobal Franca, a me matar de pancadas, enviando-me para o Caju, cemitério da minha implicância. Quer dizer, Francisco, que nem depois da minha morte esses bobalhões atenderão ao meu desejo de ser enterrado na necrópole de São João Batista, aquele santo que segundo os versos do Conde (outro conde poeta!) Montesanto tinha os olhos cor d’ametista, e que atualmente dá nome a um cemitério elegante. Presidente, o Conde Celso, ministro da Guerra o Delamare, ministro da Justiça o professor de Cascadura Sr. Gulim, e ministro do Exterior o Bomílcar – estava eu feito em purée para os vermes do Caju. Apesar da minha espontânea e antiga estima por você, Francisco, não era possível.
Assim, só vejo um recurso. E no recurso está o meu pedido. Faça-se você candidato à presidência. Tem o meu voto. E, francamente, ninguém duvida de que você governaria melhor que o Dr. Wenceslau e o seu eminente tio Dr. Epitácio.
Com os meus melhores votos, seu
João do Rio
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