Coluna Bilhete
Transcrição
A Dondon do Alvear. – Realmente, Dondon, desde que subiu ao poder a bota amarela do topetudo caluniador Epitácio, tenho acompanhado o seu louvável esforço para cavar um emprego. Você era só vagabundo elegante, transferindo-se do Alvear para a galeria e da galeria (a do Jardim Botânico! sabe...) para o Alvear. Uma senhora idosa uma vez me consultou sobre os seus intuitos matrimoniais, e eu li uma carta sua a respeito do ópio pela qual você, Dondon, podia ser considerado irrevogavelmente analfabeto.
O seu caso com o velho Epitácio foi por consequência um esforço de regeneração.
A primeira vez que o vi num meeting nacionalista ao lado desse estridente cavador que dá pelo nome de Calamare, iria admirar o seu topete de malandro trepado numa praça a insultar com a aquiescência do governo os portugueses que nunca lhe pediram nem o pagamento das suas “facadas”. Mas contive-me porque na baderna, além de alguns malucos, todo o pessoal nacionalista, jacobino, defensor dos 14 marcos e encrenqueiro da veneranda criança que é no fundo o meu confrade Affonso Celso – esse pessoal era simplesmente do “avança”, do venha a nós um emprego!
Você de fato prosperou. Vi-o de terno novo, depois de andar ajudando a missão do Bonifácio de Figueiredo que pelos jornais parece ter salvo todas as ilhas da ancilostomíase[COB1] com uma injeção, mas que é realmente pitoresco pela satisfeita e sorridente falta de inteligência com que diz bobagens.
Vi-o também (um pouco exasperado) fazendo um meeting com o Calamare, e certo sujeito de barbinha que parece um Santo Onofre de cós de saia, citando certo deputado mineiro que quer a nacionalização do comércio, quando podia também apresentar um projeto para a nacionalização da vergonha na Câmara – quando houvesse casos como do Nicanor e do Maurício.
Calamare, ex-bicheiro da Transoceânica, queria ser deputado para cujo exercício não é preciso competência em coisa alguma, além da competência do topete e da impudência. E Calamare apresentava:
– Vai falar agora o Dr. Dondon, republicano histórico, presidente do Centro Nacionalista dos Cariris, chefe da Liga Nacionalista dos Carijós, membro do Conselho Consultivo Nacionalista dos Manés de tilbureiros pescadores – todos filiados ao “Gil Blas[COB2] ” e a mim que sou filiado ao impertérrito Dr. Epitácio e ao incontestado Affonso Celso!
Como você subia!
Mas não me restou dúvida quanto ao seu futuro na Praia Formosa, quando esse esplêndido explorador da pátria que é o Epitácio inválido do Supremo, depois de insultar os homens de bem numa discurseira provinciana e irresponsável, estendeu-lhe a mão, Dondon, e agradeceu:
– Muito obrigado pelas suas palavras, Dr. Dondon!...
Felizmente estava você empregado.
Apenas, eu imaginava que o Epitácio o colocasse bem, muito bem, otimamente, Dondon: que o fizesse secretário da presidência, deputado, presidente de uma colônia de pesca, diretor de jornal. Só não contava é com você, Dondon do Alvear, que de finança entende o rol da lavadeira em débito, nomeado fiscal de banco.
Que é isso, Dondon? O governo quer debochar os bancos ou o regulamento feroz do Nuno Pinheiro ou apenas o Nuno Pinheiro, ou o Brasil inteiro?
Corri a lista, e vi, Dondon, que, se nem todos são como você e o Calamare quanto ao “nacionalismo cavatório”, 99% devem ter de banco, de um instituto de crédito a noção que o Dr. Epitácio tem dos cultos vegetais da Papuásia[COB3] . Como hão de se arranjar esses almofadinhas, Dondon? Ou acaba tudo em troca ou os diretores dos bancos levam uma representação ao Nuno. Mas eu sou um atrasado, e estou só a pensar o papel ridículo de se criar um regulamento atroz para fazer o diretor do British ou do London ouvindo as ordens do Dondon e do Calamare... E eu morreria de vergonha por você, Dondon, se não tivesse um consolo: o Homero Batista que é ministro...
João do Rio
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